acabaram as férias e o ano da pós-verdade.

Curitiba, Brasil

As férias de verão já acabaram. Passaram mais rápido que o Temer aprovando as pedaladas depois do golpe. E eu, claro, fiz muito pouco - quase nada - do que tinha planejado antes delas começarem. Primeiro, falhei miseravelmente com dois cursos onlines que estava fazendo mesmo com grande entusiasmo inicial. Depois, perdi algumas belas noites e madrugadas em jogos de tiro online (que vergonha). Por fim não li nem quarenta por cento dos livros que queria e não me aprofundei em alguns tópicos de física que tanto gosto, mas domino pouco - não, não era física quântica; isso ninguém entende mesmo.

Não segui o planejado, não toquei no Scrum, mas a falha não foi fracasso já que muita coisa boa aconteceu. Elas se resumem primeiro em: ócio. Santo Sagan que estais nos livros, por favor, abençoe o ócio. É a melhor coisa do mundo você poder ficar lá, de barriga para cima e olhando para o nada. Sem responsabilidades ou deadlines à vista. Você pode refletir sobre a vida, o universo e tudo mais. É incrível. Por isso fiz muito.

A segunda melhor coisa que me aconteceu se resume a: pessoas. Sei que existe aquele ditado que fala sobre o quanto mais você conhece as pessoas, mais você ama os seus cachorros. Pô, eu amo os meus cachorros pra caralho, e mesmo as pessoas forçando a barra nesses tempos de pós-verdade, digo, com ardor, que essa máxima só é real se você está conhecendo algumas poucas pessoas - as erradas, troque-as - ou se você não dedica tempo suficiente para conhecê-las. Essas férias me fizeram (re)aprender isso.

Life is short... e o caroneiro (até de veleiros) Patryk, from Polska.

Esse reaprender das férias com as pessoas devo ao couchsurfing. Nunca me arrependerei do dia que entrei para esse - nem tanto a plataforma ponto com, mas sim - estilo de vida. Nessas férias ao total foram nove pessoas (nas próximas serão o dobro) que recebemos em nossa casa. E por culpa de um erro meu ao organizar as datas no calendário, aconteceu que quatro delas ficariam em uma mesma data conosco. Achei que isso resultaria numa bagunça e seria muito difícil e estressante. Puts, como eu estava enganado - não com a parte da bagunça, a outra parte. Que dias legais! Me levou direto àquele tempo jovem de férias de escola, sabe? Onde você se junta com uns parentes e mais uns amigos deles desconhecidos numa casa de praia ou no interior.

Juntos formamos a imbatível “Super gangue-latino-honconguês”! Composta, além da Karo e eu, pelos seguintes integrantes:

Santi: hermanito argentino em seu primeiro destino rumo ao México. Saíra do emprego e estava subindo o continente com onze quilos nas costas e um ukelelê.

Mati: hermanito uruguajo e estava descendo o Brasil pelas cidades da costa até o Uruguay para uma avaliação universitária.

Yan&Yuen: casal de Hong Kong. Haviam também saído de seus empregos (ela auxiliar de enfermagem, ele profissional de TI) há pouco mais de 9 meses e já havia passado por uns quinze países.

Soma-se Darling, nossa dog, e o Cleisson, nosso roommate eventualmente. Juntos, nós jogamos muitas cartas, comemos um monte (cada dia um prato típico especialidade de cada) diferente, passeamos uns bons quilômetros por Curitiba e por último, mas não menos importante: tivemos conversas magníficas! Tudo no melhor inglês “Past Participle o quê?!”. Nossos assuntos começavam em Demócrito e a escola atomista grega (Mati é professor de filosofia no secundário) e chegavam até as políticas atuais do Partido Comunista Chinês e como isso afeta os cidadãos de Hong Kong. Eu sentia meu cérebro doer, mas era uma dor boa tipo arrancar dente. Para ajudar, nesses dias também, graças a eles, aprendi uma migalhinha de mandarim e toquei minha primeira canção em um ukelelê, “Knocking on Heavens Door” do Dylan.

Triste, depois, eram os dias passando e eu batendo a porta do apartamento para fechá-la depois de dar adeus a todos eles, um por um. Sério, eu fucking odeio despedidas, mas apesar disso sei que eles (assim como eu) ainda tinham muita estrada pela frente e pessoas para conhecer; dali a alguns dias minha rotina voltaria, “preso” numa cadeira de escritório ou “preso” na sala da universidade, mas como meus novos amigos que eram, a liberdade deles enchia o meu coração de liberdade também.